Transtornos mentais e comportamentais já eram considerados os grandes vilões do século 21. Diante da pandemia do novo coronavírus, iniciada em 2020, o cenário piorou consideravelmente e a Justiça do Trabalho busca cada vez mais alertar e educar empregadores e empregados a respeito dos riscos que doenças como depressão e ansiedade podem ocasionar.
Novas situações estressantes como a adaptação ao home office; acúmulo de tarefas profissionais e domésticas; endividamento; incertezas sobre o futuro; o medo do contágio, cumuladas com antigas como ansiedade; depressão; e síndrome do pânico resultaram em uma alta de quase 30% de afastamentos em comparação com 2019, segundo dados da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho.
Motivos como depressão e ansiedade registraram a maior alta entre as principais doenças indicadas como razão para o pedido de benefícios previdenciários perante o INSS. O número de concessões passou de 213,2 mil, em 2019, para 285,2 mil, em 2020, com aumento de 33,7%, e são a principal causa de pagamento de auxílio-doença não relacionado a acidentes de trabalho (30,67%), seguidos de outros transtornos ansiosos (17,9%).
Inegável que a crise sanitária e social que enfrentamos no país tem grande influência nesses dados. Os participantes da pesquisa realizada com instituições de todas as partes do mundo, “Mental Health among Adults during the COVID-19 Pandemic Lockdown: A Cross-Sectional Multi-Country Comparison” (Saúde mental entre adultos durante o lockdown da pandemia da Covid-19: uma comparação transversal entre países), constataram que os brasileiros tiveram a maior taxa de ansiedade e depressão entre os 11 países analisados (Brasil, Bulgária, China, Índia, Irlanda, Macedônia do Norte, Malásia, Singapura, Espanha, Turquia e Estados Unidos).
Todos esses dados e pesquisas recentes (ainda em desenvolvimento) apenas demonstram que os problemas mentais decorrentes da pandemia irão gerar grande movimentação na Justiça do Trabalho Brasileira, tendo em vista a responsabilidade de empresas para com a saúde mental de seus funcionários, assunto este que deverá ser enfrentado em conjunto por empresas e trabalhadores.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), além de ser dever dos empregadores e gestores a contribuição ativamente para a promoção e a proteção da saúde, da segurança e do bem-estar de todos para um ambiente de trabalho saudável, é imprescindível que haja o oferecimento de suporte aos empregados, o envolvimento deles no processo de tomada de decisões (o que desenvolve um senso de controle e participação), práticas organizacionais que promovam um equilíbrio saudável entre trabalho e vida pessoal e programas que reconheçam e recompensem a contribuição dos empregados.
O Conselho Nacional de Justiça também já se posicionou no que diz respeito a este tema. Para o CNJ, para que haja qualidade de vida no trabalho, não bastam apenas condições adequadas e boas relações socioprofissionais, sendo necessário também o reconhecimento do trabalho realizado e as possibilidades de crescimento profissional. Dessa forma, os programas institucionais devem buscar o equilíbrio das necessidades biológicas, psicológicas, sociais e organizacionais de todos os trabalhadores e gestores.
Outrossim, as empresas devem analisar também a perda econômica gerada em decorrência da falta de produtividade que vem acompanhada de doenças e transtornos psicológicos. De acordo com a OMS, o impacto econômico que 264 milhões de pessoas que atualmente sofrem com problemas como ansiedade e depressão no mundo todo, gera um custo estimado à economia global de US$1 trilhão por ano em perda de produtividade.
Se considerarmos a estimativa que para cada US$1 investido em programas e tratamento para os transtornos mais comuns, haverá um retorno de US$4 em melhora de saúde e de produtividade, o investimento nestas ações passa a ter grande importância econômica para as empresas, sendo uma ótima estratégica de gestão.
Fato é que o trabalho de maneira presencial, realizado na companhia de colegas e com contato humano foi transferido: começou a ser desempenhado em casa. Quem não pôde se afastar e continuou a trabalhar presencialmente passou a conviver com a ansiedade e o medo do vírus. Em outras situações, devido à crise multifacetada enfrentada (econômica, social, política, sanitária, humanitária) houve a perda do emprego e da renda. Ou seja, houve a cumulação de sentimentos antigos como ansiedade e depressão com frustrações e tristezas novas, como a perda de amigos e parentes próximos – por vezes sem quaisquer outras doenças antecedentes.
Mais do que nunca, a promoção e o cuidado com a saúde mental são ações essenciais dentro das empresas. Possuir uma equipe de saúde mental (com psicólogo, assistente social e psiquiatra); produzir cartilhas informativas sobre o assunto; realizar palestras com enfoque psicoeducacional; rodas de conversa e atividades práticas para estimular o bem estar físico e mental, inclusive com orientação para exercícios físicos, são iniciativas que podem salvar o orçamento do empregador e, sobretudo, a saúde do empregado.
Texto de autoria de Felipe Vilela, membro da Equipe Tambelli.